Início » Notícias » ESPECIAL – ENTREVISTA OSVALDO MACIEL, PRÉ-CANDIDATO A SENADOR DE ALMA LEOPOLDINENSE

ESPECIAL – ENTREVISTA OSVALDO MACIEL, PRÉ-CANDIDATO A SENADOR DE ALMA LEOPOLDINENSE

Osvaldo-Maciel

Criado no seio de Colônia Leopoldina, Osvaldo Maciel disputará uma cadeira no Senado Federal em 2018

Colônia terá um representante na disputa de uma das duas vagas ao Senado esse ano. Osvaldo Maciel, filho adotivo ilustre da cidade e historiador pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) é candidato a Senador da República pelo tradicional Partido Comunista Brasileiro (PCB). Nos últimos dois anos, o professor vinha exercendo o cargo de Diretor da EDUFAL – Editora da UFAL – função da qual agora se afasta para abraçar uma missão político-partidária inédita em sua carreira.

Doutor em sua área de conhecimento e referência no estado, Osvaldo é um estudioso dedicado a temas classistas, com inúmeras pesquisas publicadas que tratam de uma história de Alagoas que diverge da versão oficial. Atualmente, é secretário político do chamado Partidão, como é conhecido o PCB, fundado em 1922 e primeira agremiação política brasileira a atuar na clandestinidade.

A candidatura de Osvaldo foi tornada pública pelo PCB no último dia 13/5, por ocasião do lançamento do pré-candidato ao governo de Alagoas Basile Christoupolos, pelo PSOL, e foi prestigiada por Guilherme Boulos, que disputará a Presidência da República pelo PSOL. As duas agremiações apresentam-se como uma frente de esquerda alternativa em Alagoas, em contraponto à hegemonia eleitoral dos Calheiros para as eleições de 2018.

Por meio de nota, o PCB afirma que a candidatura de Maciel “representa o esforço coletivo da frente de esquerda em Alagoas, com o objetivo de denunciar os graves indicadores sociais do estado, propondo a construção de uma plataforma política que combata os grupos oligárquicos e que construa o poder popular em Alagoas e no Brasil”

O pré-candidato concedeu uma entrevista exclusiva ao Conexão Colônia, falou sobre sua motivação para o pleito e, entre outras questões, avaliou o cenário social e político da região.

CC – Qual a motivação de sua pré-candidatura ao Senado frente a nomes tão tradicionais da política alagoana? Seria uma tarefa ideológica?

Toda nossa vida, nossas atitudes, nossas decisões são ideológicas. Quando um senador como Biu de Lira decide se candidatar ao senado, como o fez a 8 anos atrás, sem apresentar nenhuma proposta consistente, e pautando sua campanha da TV dançando de forma ridícula, estava se postando ideologicamente. Algo como quem diz: a política é uma brincadeira. E, convenhamos, política não pode ser considerada uma brincadeira, pois possui impactos na vida e no destino de toda a sociedade. Minha tarefa é tanto ideológica como o é a tarefa de se candidatar de velhos nomes dos grupos oligárquicos alagoanos, como Renan Calheiros e Maurício Quintela ou Marx Beltrão. Só que, em função do senso comum disseminado, muitos acreditam que apenas as candidaturas da esquerda são ideológicas. Ora, a direita é ideológica! A defesa da pena de morte e a defesa de que o estado deve ser mínimo, são decisões ideológicas. Defender que não pode haver educação sexual na escola é uma opção ideológica também! É uma opção ideológica que impede que crianças e adolescentes, principalmente as meninas, aprendam a se proteger do assédio sexual, e denunciem eventuais práticas sexuais abusivas que muitas vezes ocorrem dentro de casa. Isso é ideológico também. Infelizmente, a visão comum conservadora apresenta que uma política de educação sexual seja uma “ideologia de gênero”, camuflando o sentido ideológico de sua postura também. É como se eles dissessem: vamos manter as coisas como estão, e não praticar ideologia. Mas, isso é o que pesa na nossa vida como um fardo imensamente pesado: a sociedade em que vivemos é produto de decisões ideológicas!

A decisão de ser pré-candidato ao senado foi uma decisão tomada pelo PCB, partido em que milito, e corroborada pela coligação com o PSOL e o MTST. Nacionalmente, estamos apresentando as pré-candidaturas de Guilherme Boulos e de Sônia Guajajara para a presidência do País. Em Alagoas, já apresentamos a pré-candidatura do professor Basile Christopoulos ao governo estadual. Minha pré-candidatura se apresenta como uma proposta coletiva, com apoio e solidariedade de diversos grupos e forças políticas e, pelo que está se desenhando, será a única alternativa popular e de esquerda aos velhos caciques e grupos que sempre representaram os interesses de setores privilegiados alagoanos, e nunca os interesses da maioria da população. São esses velhos grupos que tratam o senado apenas como um espaço para aumentar seu poder e distribuir migalhas às prefeituras e órgãos através de emendas parlamentares, migalhas que não resolvem os graves problemas que nós enfrentamos em nossa sociedade.

CC – É a primeira vez que você disputa um cargo público? Como se relacionam sua carreira política e sua trajetória intelectual?

Sim, é a primeira vez. Apesar de sempre ser simpatizante das pautas da esquerda, desde os anos 1980, nunca havia militado antes em um partido. Entrei no PCB (Partido Comunista Brasileiro) em 2011, quando estava terminando o meu doutorado, e já tinha uma experiência profissional reconhecida em alguns espaços. De fato, todos os meus esforços de estudos e de debates pedagógicos, minha atuação na sala de aula e na Academia, os temas que pesquisava (história dos trabalhadores e dos escravizados, a teoria marxista da história etc.) confluíram para que eu fosse fortalecendo a necessidade de atuar de forma política mais organizada. Foi neste período que decidi entrar no PCB, e estamos engajados no processo de reconstrução revolucionária do partido nacionalmente. O PCB que tem quase 100 anos de fundação, passou por um momento muito difícil entre a década de 1990 e início desse século, com a postura de liquidação que tentou acabar com o partido, mas se reorganizou e vem crescendo no país inteiro. Do ponto de vista prático, minha militância política diminui o tempo para realizar leituras, análises historiográficas, pesquisas em arquivos, e também as orientações e participações em eventos científicos, coisas típicas de minha atuação profissional. Isso já vem diminuindo minha produção. É uma opção difícil de ser tomada, pois já estava em minha zona de conforto, com um nome consolidado em âmbito regional e sendo procurado por outros pesquisadores nacionais. Sair dessa zona de conforto para ser atacado nas redes sociais por conservadores e por figuras proto-fascistas, ou mesmo ter que abdicar de financiamentos de pesquisa (que geram um certo tipo de status acadêmico) para realizar críticas às classes dominantes não é uma decisão fácil de ser tomada. De todo modo, estamos tentando conciliar minimamente estas duas esferas de minha atuação pública, a profissional/acadêmica e a política.

CC – Você faz parte de uma tradicional família de Colônia Leopoldina. Qual a sua história com a cidade?

Não conheci meus avós maternos, mas a família de minha mãe, Dulce, veio do sertão e se assentou na Usina Taquara. Do lado de meu pai, Antonio Acioly, mais conhecido como Totinha, temos o ramo mais tradicional da família na cidade. Meu avô paterno tinha um pequeno sítio em que plantava vários produtos, sítio que foi engolido pelo canavial, e tinha também um barracão onde vendia bebidas e estiva em geral, lá em Sertãozinho, distrito de Maraial, Pernambuco. Daí, meu pai e seus vários irmãos, tornaram-se pequenos comerciantes em geral, e tenho uma tia que se tornou professora, de quem segui a profissão dela e de minha avó, que também foi professora. A família Acioly Maciel é tradicional na cidade, e possui posições muitas vezes conservadoras, típicas da chamada “classe média” baixa. Por exemplo: cresci ouvindo minha mãe afirmar que, na sua infância, a usina Taquara era bem administrada por Zé Lessa, com uma postura paternalista, que ajudava os mais pobres etc. Ela dizia que havia riachos bons de banho, frutas nos pés e outras coisas. Mas a verdade é que essa visão romântica não se sustenta por muito tempo, pois foi o setor canavieiro que acabou com o rio Jacuípe, e que transformou nossas matas em um imenso e monótono canavial cada vez mais desértico. Então, a administração de Zé Lessa contribuiu com a grave crise do meio ambiente em que vivemos na zona da mata alagoana. Não podemos nos fechar ao olhar microscópico que nos cerca, não podemos ficar apenas na visão de nossa vida pessoal, biográfica e privada. De fato, minha militância política em um partido revolucionário e comunista, e minha candidatura com pautas da esquerda, pode representar uma ruptura com a visão mais geral de alguns membros da família, mas não vejo isso como um problema, pois todos conhecem meu caráter, a seriedade com que trato o trabalho e a coisa pública. Esse caráter e esse compromisso eu também aprendi no seio dessa família e na interação com toda a sociedade. Devo muito do que sou, por exemplo, a meus tios Zequinha (da farmácia) e Taninha, pois eles me possibilitaram vir estudar em Maceió, e adquirir a formação que tive. Foi essa formação que me tornou mais consciente, e me fez abrir um mundo de ideias que seria mais difícil de adquirir se continuasse vivendo em Colônia. Num grupo de whatsapp que temos da família, que é ilustrado com a foto de minha avó materna, Vó Maria, temos alguns debates acalorados, pois uma parte defende Bolsonaro e a maioria apoiou o golpe contra Dilma. Às vezes fico isolado no debate, mas volta e meia vem um primo ou outro me ajudar na arenga familiar. É normal. Vamos sobrevivendo, nesta tensão que é a vida familiar, pois ela não impede que nós nos amemos, e vivamos com outras pessoas, conheçamos outras ideias e sigamos em frente.

CC – Você acompanha o cenário político da cidade e da região? Qual a leitura histórica faz da realidade social de Colônia hoje, marcada pelo desemprego gerado pela crise das usinas?

Não acompanho do modo como deveria. De fato, conheço pouco dos últimos governos municipais, e da atuação dos vereadores. Apesar de ficar sabendo de um ou outro detalhe das administrações, percebo que tanto com Manuilson como com a Paula houve alguns acertos e limitações de ordem da equipe de governo, de algumas decisões que tomaram, mas parece-me que a questão é bem mais complexa, com desafios muito maiores. Não conheço nenhuma prefeitura municipal que ande bem das pernas e que tenha as finanças bem sanadas. Sua receita normalmente já está bem comprometida, e advém de recursos externos. É uma lástima, mas foi esse o modelo que os poderosos escolheram, e que nossa sociedade seguiu. Este modelo deixa as prefeituras na mão de grupos políticos mais fortes em nível estadual ou federal, sobrevivendo a partir de acordos muitas vezes realizados nos bastidores da vida pública, normalmente com projetos para captação de recursos e emendas extras sendo filtradas por deputados ou senadores que não possuem real interesse no desenvolvimento regional. A imensa maioria dos parlamentares para os quais muitos prefeitos devem favores, trabalham apenas com o cálculo mesquinho de saber o quanto sua posição política vai melhorar no município com apoio aquele projeto? Como irá se projetar ou consolidar sua imagem na cidade, se “trouxer” recursos para alguma melhoria ou coisa do tipo? Ora, esse modelo de política é muito mesquinho, pois só enxerga no curto prazo de quatro anos de mandato, e é muito patrimonialista, pois entende que os recursos públicos devem ser utilizados para fins de natureza privada, para benefício próprio de sua imagem política etc. Isso é algo que deve acabar! Se alguma decisão não for tomada no médio prazo teremos graves problemas administrativos nos municípios, podendo gerar uma quebra generalizada, com implicações inclusive na previdência desses municípios (que paga aposentadoria e benefícios aos servidores municipais), e na manutenção de políticas públicas básicas, tais como as aulas nas escolas e o atendimento básico de saúde. Será uma calamidade que precisa ser evitada.

Para o caso específico de Colônia Leopoldina, parece-me que a situação econômica é uma das mais graves, pois a crise do setor canavieiro é muito mais profunda e forte nesta região do que no tabuleiro central do estado ou na região Sul do estado, nas regiões de São Miguel dos Campos e Coruripe. Com a longa crise vivida pelo setor canavieiro, as primeiras usinas a fecharem se situam no litoral e na mata norte. Não conheço detalhes da administração da Usina Taquara, mas acho improvável que ela esteja numa fase boa. Imagino as dificuldades que os fornecedores estão passando para garantir a sobrevivência de suas atividades. Se um setor médio como este, dos fornecedores, passa por dificuldades, imagine os desafios para a imensa maioria dos bairros da periferia da cidade e para os moradores dos distritos e povoados. Infelizmente, não há nenhuma saída mais consistente que esteja sendo planejada no curto prazo pelas nossas autoridades públicas. Entra governo e sai governo, e eles não conseguem apresentar um modelo alternativo ao setor canavieiro, pois são representantes desta visão de mundo decadente. De fato, é preciso apresentar uma saída consistente, e ela passa pela pequena agricultura e pela produção coletiva dos assentamentos. Se o Poder Público investir uma pequena parte do que gasta com o setor canavieiro (em subsídios, isenções, benefícios fiscais etc) e montar uma infra estrutura básica para a agricultura familiar, com uma rede de assistência técnica robusta (gerando emprego para dezenas de técnicos agrícolas que são formados, por exemplo, em Barreiros para onde jovens leopoldinenses vão estudar), teríamos um outro cenário de alimentação, renda e pequenos e médios empreendimentos surgindo em 5 ou 7 anos. Porém, para que isso ocorra, é preciso que haja a construção de um novo pacto social que se comprometa com a superação do atraso da economia canavieira. E isso, a imensa maioria dos parlamentares e todos os governos da história de Alagoas, desde pelo menos o início da década de 1960, não estão comprometidos em mudar.

CC – Em 2017, o Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (TRT/AL) lhe condecorou junto a outras 29 personalidades a Comenda da Ordem do Mérito Ministro Silvério Fernandes de Araújo Jorge, como destaque por suas atividades como servidor público. O que significou para você essa homenagem?

Esta homenagem foi uma grata surpresa, que me deixou bastante emocionado, pois normalmente as pessoas que são indicadas para essa comenda são grandes empresários, políticos de renome, e profissionais do campo jurídico que atual com a área trabalhista. Fui indicado por conta do trabalho de pesquisa que desenvolvo no acervo do Memorial Pontes de Miranda, que é vinculado ao TRT. Neste acervo, já foram digitalizados cerca de 2000 processos trabalhistas entre a década de 1940 e 1980. Estamos também alimentando um banco de dados e analisando o potencial deste acervo para novas pesquisas. A partir desta pesquisa, entre outras coisas, estamos revelando que a história de Alagoas não é somente a história dos marechais e das oligarquias, mas que também os trabalhadores possuem uma longa história de resistência, de conquistas históricas e de lutas pela garantia de direitos sociais e trabalhistas. Descobrimos também que desde a implementação do Golpe de 1964, ainda no começo de maio daquele ano, já houve perseguição a trabalhadores e intervenção nos sindicatos de diversas categorias em nosso estado. Isso desmente a ideia de que a ditadura não foi violenta em Alagoas. Por fim, os dados que já temos levantados, revelam o quanto a presença das mulheres é significativa nesta história. Isto revela que é preciso contar a história operária, deixando claro que é uma classe social que possui dois sexos, e que sua história não é uma história apenas de líderes masculinos. Para mim, ser indicado de forma espontânea e receber essa comenda foi uma honra, um reconhecimento do trabalho que desenvolvemos junto com bolsistas e outros pesquisadores. Fiquei mais feliz ainda pois recebi a homenagem junto com um dos religiosos do mosteiro do Catita, cujo nome me foge no momento. Essa coincidência me lembrou das minhas raízes leopoldinenses.

 FONTE: http://conexaocolonia.com.br/especial-entrevista-osvaldo-maciel-pre-candidato-a-senador-de-alma-leopoldinense/